O sonho da calça 36
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Sempre sonhei em ser magra.
Passei a minha infância inteira recebendo apelidos como “fofinha”, “gordinha”,
“cheinha” e, acreditem, eram os mais leves. Minhas roupas sempre eram dois números a mais para a minha idade e lembro que sempre ficava longe da sessão infantil nas lojas de departamento, já
que as roupas de lá não cabiam na criança que eu era. Aos 12 anos já vestia 40
e aquilo me consumia aos poucos, já que as roupas da moda para minha idade não me serviam. Nos exames, as taxas estavam reguladas e a
minha saúde em perfeito estado, mas o que via no espelho não me agradava. Não gostava do meu braço, do meu rosto, do meu cabelo e sempre queria mudar algo em mim.
O
tempo foi passando, a altura aumentando e dei à famosa esticada, no entanto o
sonho de ser magra ainda estava distante. Cheguei certa vez até o 44. Aquilo me
deixou louca, pois sonhava em um dia usar 36. Comecei as dietas, os exercícios
e até pular refeições, até que alcancei com muito esforço e infelicidade o 38.
Nossa, lembro-me da felicidade em ter uma calça daquele tamanho no
guarda-roupa. Ela foi a única, pois percebi na próxima ida ao shopping que
aquele número só vestiu o meu corpo porque a fôrma era grande.
A decepção refletiu na fome e mais uma vez
engordei. Vivia pulando de número em número e o efeito sanfona sempre me
acompanhava. Não gostava da minha bochecha, da minha barriga, do meu braço... e
o meu hobby era me comparar. Para ficar
feliz me comparava com pessoas que eu considerava mais gorda do que eu e quando
achava alguém que tinha o corpo que eu queria, me comparava e ficava triste,
assim levava a vida até amadurecer a imagem que via refletida.
Não lembro ao
certo o que me levou tomar essa decisão ou o que me fez abrir os olhos, só
lembro que decidi não me rotular por um número. Não era vestir 36 que me faria
feliz, era, provavelmente, comer sem culpa, me amar sem culpa, vestir a roupa
que queria sem culpa. Percebi que os manequins não eram para mim, que não teria
aquele quadril e nem aqueles braços e que poderia morrer tentando alcançar
aquele padrão estético ou aceitar o meu e seguir em frente. Tornei-me uma pessoa decidida e confiante com
isso? Com certeza não, mas parei de sonhar com a calça 36 e passei a sonhar com
o dia em que me amasse completamente. Esse dia ainda não chegou, mas essa é a
única busca incessante que quero ter.
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